Os dois primeiros finais de semana, de dezembro, foram marcados pela realização de duas das mais importantes manifestações culturais da cidade, dois grandes eventos que reúnem tradição, movem a economia, fortalecem a cultura local, além de servir como vitrine política.
Tradição
A Lavagem do Caranguejo festejou, nos dias 1 e 2, a sua 35º edição que, apesar de ter tido um formato reduzido, em comparação com edições anteriores, demonstrou um cuidado maior com o quesito tradição.
O Jornal Folha Popular conversou com diversos agentes e produtores culturais, ligados ao governo, como da sociedade civil e ambos compreendem que há uma tendência natural da perda da tradição, dessas manifestações populares, e, que o papel dos que estão à frente dessas produções, é justamente manter “o trem nos trilhos”.
O secretário municipal de Cultura, Manoel Carlucho, afirma que o avanço da tecnologia, as novas ferramentas de comunicação e as modernas estratégias de marketing e produção, incidem sobre a concepção cultural das comunidades, principalmente sobre a juventude. Carlucho entende que não se pode travar uma luta contra o novo, contudo, defende que a tradição não pode ser comprometida. “Com habilidade e capacidade de ouvir a todos, é possível conciliar sim. É possível produzi,r com modernidade, assegurando o tradicional”. Afirmou.
Portão, por sua vez, carece amadurecer esse debate, pois apesar do forte apelo tradicional que a festa popular traz, ainda se ouve nitidamente as pessoas chamar a festa de Micareta de Portão, ao em invés de Grande Festa de Portão, e, esse fato, por si só, traduz o quanto é necessária uma intervenção de conscientização e resgate da matriz tradicional que idealizou e originou a festa.
Economia
Não há dúvida de que essas duas grandes festas, realizadas nos bairros mais populosos da cidade, movimentam e aquecem a economia local, seja no comércio informal dos ambulantes, gravações das bandas nos estúdios, compra de tecidos, utensílios de fantasia etc. O cachê pago as artistas e a contratação de serviços provenientes das festas, injetam alguns milhares de reais na economia local, mas, segundo, André Siqueira Zaragosí, ex-secretário de Cultura e presidente da Equilíbrio Social, falta um estudo do impacto desse capital, e, principalmente, uma estratégia para que o mercado invista na festa, já que há retorno financeiro.
“Imagine a quantidade de cerveja e refrigerante, a quantidade de água que é consumida nestas festas. Qual o investimento dessas empresas que vendem tanto?” Questiona. Zaragosí acredita que a abertura para o investimento privado, abre espaço para a profissionalização e menor impacto no o erário público.
Política
A Grande Festa de Portão e a Lavagem do Caranguejo, se caracterizam, também, pelo status de vitrine política que exercem. É comum que grupos políticos organizem aparições de suas lideranças no percurso da festa, por conta de seu apelo popular. Há até blocos inscritos, oficialmente, que são financiados por grupos com interesses exclusivamente políticos. A aparição na festa pode servir como um termômetro da disputa eleitoral.
Apesar dessas aparições e disputas políticas, dos espaços na festa, acontecerem somente em períodos que antecedem à disputa eleitoral, a cidade foi surpreendida nesta edição 2018, com a antecipação desse processo.
Surpreendentemente o grupo que faz oposição ao governo de Moema Gramacho, entrou em campo nas duas festas e provocou uma agitação no núcleo duro do governo. Uma semana após anunciar a criação da chapa, que traz o empresário Teobaldo Costa e Matheus Reis, como prefeito e vice-prefeito, respectivamente, o grupo liderado por eles desenvolveu estratégias de participação que acabaram por mudar, por alguns instantes, o foco principal da festa e obrigou o governo a acender a luz amarela.
A ausência da deputada estadual, Mirela Macedo, na lavagem de Itinga e na Grande Festa de Portão, foi especulada por alguns, como estratégia para se manter neutra no processo de disputa, que só deve se intensificar no final de 2019, pois, segundo nossas fontes, Mirela pode aparecer como terceira via.
Aspectos gerais da festa
Em vias gerais, na opinião de Ivan Andrade, conselheiro municipal de Cultura, além das de Banzay e Pai César, representantes das comissões de eventos de Portão e Itinga, ambas as festas tiveram um desempenho, abaixo das anteriores, e, das expectativas geradas na comunidade. “Os artistas sempre esperam que a festa seguinte seja melhor do que a que a anterior, por isso há esse clima de frustração, mas admitimos que foram festas lindas, mesmo com os intempéries”. Finalizou.
Para Elisângela Sousa, assessora especial da Secult, a situação econômica, pela qual passa o país e o Estado, incide diretamente sobre o município. Segundo Zazá, grande parte dos projetos culturais precisaram ser adaptados à realidade econômica, para terem suas execuções asseguradas. “Muita gente não faz ideia das dificuldades que enfrentamos, para garantir as estruturas e o melhor para as atividades. Nesta festa de Portão, por exemplo, precisei tomar uma decisão política, junto à secretaria e ao Conselho de Cultura, e, espero, contar com a compreensão dos meus superiores, mas o fiz com a consciência de que estava fazendo o melhor e espero realmente ter ajudado….”
Apesar da nossa insistência, Zazá preferiu não revelar os detalhes dessa decisão, alegando motivos internos relacionados à administração pública.
Mas as festas foram recheadas de grandes momentos e brilhantes apresentações dos nossos artistas. Destacamos, aqui, a apresentação da banda Baile do Tchello, no domingo dia 2, na Lavagem do Caranguejo em Itinga. Tchello e sua banda deram um show à parte e contou com a participação especial, da cantora Milla Ribeiro, que encantou o público com seu talento e sensualidade singular.
Em Portão, o sábado foi marcado pela apresentação do grupo Viola de 12, que embalou o público ao som do bom samba de Viola. Já no domingo, dois grandes momentos atingiram o ápice da festa. A apresentação da Banda Pegadeira, sensação do bairro, e, a mais esperada da noite, sacudiu a praça. O pagode na voz potente de Nega da Pegadeira, agitou a multidão. Mas talvez o grande momento da festa, tenha sido, mesmo, a apresentação de Ju Cobra e Banda Pensamento Positivo, que por muito pouco não ficaram fora da festa, por conta dos ajustes de horário, em virtude de atrasos. Mas o que se viu, durante a apresentação dos artistas, foi um verdadeiro espetáculo a céu aberto, no coração de Portão.
Irreverente, Jú Cobra cantou dançou e interagiu com o público, sendo acompanhado por uma banda afinada e que arrancou suspiros de quem esteve presente à festa. Pessoas chegaram a estender o braço e apontar a pele arrepiada quando a banda tocou sucessos de Bob Marley e Alpha Blondy.
Jú Cobra socializou seu tempo com artistas e personalidades do bairro como, Manga, que incorporou Edson Gomes. Wilson Negrine soltou seu vozeirão ao interpretar “No Woman no Cry”. Edson do Beat Box, também deu um show à parte, ficando, para Milla Ribeiro, o fechamento da apresentação da banda, ao lado de Ju Cobra. Momentos especiais que ficarão nos anais da história.
Por: Ricardo Andrade